Está acabando! 🙁 Para a próxima semana, lemos mais dois capítulos –  até a página 267, se você tem a edição da foto.

Por Mariane Domingos e Tainara Machado

Perdas e descobertas chacoalharam a vida de Kambili. A garota que voltou para casa depois de uma temporada em Nsukka não é mais a mesma.

Em poucos dias, ela ganhou e perdeu alguém na família: seu avô. A breve convivência com ele na casa da tia Ifeoma valeu mais do que os últimos anos de visitas monitoradas e rápidas que Papa autorizava. Sob o incentivo da tia, Kambili se permitiu conhecer melhor aquele “homem pagão” e entender seus costumes.

O estranhamento é claro no começo. Kambili, doutrinada por Papa durante tantos anos, questiona a tia sobre como Nossa Senhora pode interceder por um pagão. O que temos a seguir é uma aula sobre respeito às tradições. Às vezes, nos lembra tia Ifeoma, o que é diferente é tão bom quanto o que é familiar. Estamos – ou ao menos deveríamos estar – todos rezando pelas mesmas coisas.

Em uma das cenas mais bonitas desses últimos capítulos, a garota, convidada pela tia, assiste, com um misto de curiosidade e admiração, à oração matutina do avô. Após acompanhar a cena toda, Kambili nos surpreende com uma conclusão bastante crítica do que viu, comparando os ritos do avô com sua própria religião:

Ele ainda sorria quando me virei silenciosamente e voltei para o quarto. Eu nunca sorria depois de rezar o rosário em casa. Nenhum de nós sorria.

A morte do avô abala tia Ifeoma, seus filhos e também Jaja e Kambili, que estavam aprendendo com o avô que família pode significar também intimidade e conforto, e não apenas medo e obediência. Essa, talvez, tenha sido a primeira vez que os irmãos veem a morte de perto. Chimamanda conseguiu narrar esse momento com delicadeza, equilibrando os sentimentos de tristeza com a sensação de naturalidade – a morte como um destino natural da vida, o fechamento de um ciclo. Detalhes práticos, como levar o corpo do avô ao necrotério ou esfregar o colchão em que ele dormia, são intercalados como diálogos singelos, como este entre a tia e Kambili:

– Você viu o rosto de seu Papa-Nnukwu na morte, Kambili? – perguntou tia Ifeoma, apoiando o colchão limpo sobre o gradil de metal para secar.

Eu balancei a cabeça. Não havia olhado para o rosto dele.

– Ele estava sorrindo – disse ela. – Ele estava sorrindo.

Virei o rosto para que tia Ifeoma não visse minhas lágrimas e eu não visse as dela.

O avô não foi o único parente que Kambili conquistou nesses dias em Nsukka. Amaka também baixou a guarda e deu mostras de que a prima havia ganhado pontos com ela. Depois de questionada por tia Ifeoma sobre o porquê de ela nunca responder à altura as provocações de Amaka, Kambili surpreende e enfrenta a adolescente. A resposta ganha o respeito de Amaka. 

 – Então você sabe falar alto, Kambili.  

A partir daí, a postura dela muda. Kambili deixa Nsukka com um laço mais forte com a prima que, com certeza, irá lhe ajudar no retorno ao ambiente hostil de sua casa.

Padre Amadi também ganhou destaque nesses últimos capítulos, pois passou a ocupar um papel central nos pensamentos de Kambili. As reflexões da menina, não importa em que situação ou lugar ela estivesse, sempre desembocavam nele: o padre Amadi. Ele é o primeiro que consegue arrancar uma risada sua, que a convence a usar shorts, que a tira de sua mudez habitual. Seria a primeira paixão de Kambili? A maneira como Chimamanda conduz essa narrativa, pelo olhar de Kambili, é muito interessante, porque ela faz o leitor viver junto com a menina essa descoberta. Embora sejamos capazes de perceber antes que a menina está nutrindo um sentimento diferente pelo padre, para a própria narradora isso não é tão óbvio. Chimamanda nos faz sentir adolescentes de novo:

Até então, eu estivera desenhando bonequinhos de palito num papel e escrevendo “Padre Amadi” nele várias vezes. Rasguei o papel.

E rasguei muitos outros na semana seguinte. Todos tinham “Padre Amadi” escrito várias vezes. (…) Mas eu não precisava escrever o nome do padre Amadi para vê-lo. Reconheci um pouco do seu caminhar, daquele andar confiante, nos passos do jardineiro. Vi seu corpo esguio e musculoso em Kevin e, quando as aulas voltaram, até um lampejo de seu sorriso em Madre Lucy.

A sensação que temos é que os dias no lar de tia Ifeoma foram uma preparação: Kambili estava descobrindo suas forças para enfrentar a volta para casa. Ela floresceu longe do olhar intolerante de Papa. A relação que ela construiu com Amaka, a aproximação com o avô e a atração por Padre Amadi fortaleceram Kambili.

Mal chegou em casa, a garota já precisou usar essa força. Papa se mostrou mais fora de controle que nunca e castigou severamente os filhos por terem escondido dele que estavam dormindo sob o mesmo teto de um pagão – seu próprio pai. Banhou os pés deles com água fervente para que lembrassem que é “é isto que você faz consigo mesma quando caminha na direção do pecado. Queima os pés”. Mas algo foi diferente nesse castigo: Kambili sentiu e aceitou a dor, mas não sentiu nem aceitou a culpa. Seguimos a leitura até mais animados!

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