A leitura de Laços, de Domenico Starnone, continua a nos surpreender por sua intensidade. No último trecho, vemos que de fato um relacionamento tão fraturado quanto o de Aldo e Vanda só pode ser remendado superficialmente. Na próxima semana, nos despedirmos deste pequeno grande livro! Está acompanhando a leitura com a gente? Então não deixe de compartilhar suas impressões aqui com a gente!

Por Mariane Domingos e Tainara Machado

Com alguns amigos que também estão acompanhando a leitura conosco, discutimos recentemente sobre a opção de Starnone pela primeira pessoa para a condução da narrativa em Laços.

Em um primeiro momento, somos tomados por uma angústia colérica a partir do ponto de vista de Vanda, que escreve cartas para o marido no período de cinco anos em que eles ficaram afastados.

Quando Aldo assume a condução da narrativa, esperamos de certa forma que ele se contraponha ao que acabamos de ler, que reaja, que mostre até que ponto podemos enlouquecer quando tomados pela dor da traição.

Os sentimentos que ele transborda, contudo, são bem menos enfáticos. Ao abandonar a esposa e os filhos, Aldo se compadece da dor que eles sentem, mas não se solidariza verdadeiramente, e nem se remói em culpa. Seu egoísmo fica explícito quando Vanda tenta fazer com que ele assuma as responsabilidades na criação dos filhos, e ele prefere apenas se abstrair para poder aproveitar o tempo com a amante.

Mesmo em seu retorno para casa, sua posição é passiva. Foi empurrado para Vanda porque sentia que não havia mais espaço para si na vida de Lídia, mas continuou a amando, mantendo casos extraconjugais. Sua força de caráter, embora se considere um homem movido pela força de seu tempo, pelo questionamento das instituições, é praticamente nula.

Cabe mais uma vez à Vanda enfrentar o castelo de cartas sobre o qual o relacionamento foi construído. O objeto que guarda segredos dessa vez é um dicionário de latim, que traz o verdadeiro significado de Labes, nome dado ao gato desaparecido da família: queda, desmoronamento, ruína.

A labes, sim, você tem toda razão. Passaram-se anos e décadas nesse jogo, e fizemos dele uma rotina: viver no desastre, gozar da ignomínia, essa foi nossa solda.

Temos ainda o cubo que tanto preocupava Aldo, porque, em seu interior, ele escondia lembranças de sua aventura. O medo de que Vanda encontrasse as fotos de Lídia, guardadas durante tantas décadas, apavorava o narrador.

Tal qual a caixa de Pandora, da mitologia grega, aquele cubo, uma vez aberto, espalharia todos os males sobre a relação do casal, destruindo o frágil equilíbrio de uma reconciliação baseada em silêncios. O que Aldo não percebia era que o apartamento revirado já era sua caixa de Pandora. Os objetos espalhados trouxeram à tona as memórias que ambos se esforçaram, durante anos, para calar.

Vanda até esquece por um momento seu papel de guardiã desse silêncio e desabafa, em poucos minutos, algumas opiniões que guardara por muito tempo. A Vanda visceral das primeiras páginas do livro volta com tudo, trazendo ainda mais mágoa em sua fala. Depois do rompante, ela volta ao seu papel naquela relação – o de pôr ordem, obrigando a todos, inclusive a ela mesma, a fingir que nada aconteceu:

Depois do almoço, talvez porque o desabafo a depurara, Vanda voltou a ser a mesma de sempre. Metódica, sem parar um instante, pôs em ordem a cozinha, o quarto do casal, o quarto de Anna, o de Sandro, e ainda fez uma lista detalhadamente do que era preciso mandar consertar.

Como bem resumiu Ana Lima Cecilio, editora de Dias de Abandono, de Elena Ferrante,em debate sobre o livro organizado pela Todavia, neste romance parece que a mulher tenta se segurar e explode, o marido tenta explodir e se segura.

No Terceiro Livro, sabemos que teremos nova mudança de narrador. Dessa vez, vamos enxergar os fatos pelos olhos dos filhos do casal. Será que essa mudança de prisma nos trará novas perspectivas sobre esse relacionamento? Ou, como bem diz Aldo, “todo relato é um beco sem saída”? Deixe seu comentário aqui!

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