Reta final da leitura de Canção de Ninar! A relação entre a babá e os patrões está cada vez mais insustentável, e os impulsos de Louise, cada vez mais evidentes. Depois de começar o romance pelo fim, com um desfecho para lá de trágico, o que será que Slimani ainda nos reserva para os últimos capítulos? Na próxima semana, terminamos essa leitura!

Mariane Domingos e Tainara Machado

O episódio da carcaça de frango estragada, que Louise deu para Mila comer, foi a gota d’água para Myriam. Nessa obsessão da babá por evitar desperdícios, a mãe percebe que aquela Louise, de aparência tão moderada, fala mansa e gestos calmos, é capaz de chegar aos extremos.

Apesar de ficar assustada, Myriam não tem uma conversa franca com a babá, principalmente porque tem receio de perdê-la agora. Isso estragaria seus planos e sua rotina. Ela decide, junto com o marido, esperar mais um pouco até poder colocar o filho mais novo também na escola.

Essa espera, no entanto, não alivia o clima pesado. Louise, que antes era a salvadora da pátria, membro fundamental da família, não passa agora de uma empregada, na visão dos patrões. Mas será que, algum dia, ela foi mais do que isso para eles?

Segue os conselhos de Paul, que repete:

– Ela é nossa empregada, não nossa amiga.

Não bebem mais chá, juntas, na cozinha, Myriam sentada à mesa, Louise encostada no balcão. Myriam não diz mais palavras gentis: “Louise você é um anjo”, ou “não há duas como você”. (…) Cada vez menos se veem juntas no mesmo ambiente e executam uma sábia coreografia do afastamento.

A situação no apartamento de Louise também não é mais calma. O proprietário decide usar o adiantamento que ela havia pagado ao alugar o espaço para arrumar o banheiro que está intransitável.

Contra essas adversidades rotineiras, Louise parece já não ter mais forças. Ela decide direcionar seus esforços para manutenção do seu emprego, pois nota que, em breve, não será mais necessária na casa dos patrões. A ideia que lhe vem à cabeça é que Myriam engravide novamente. Ela começa, então, um plano mirabolante que envolve até a pequena Mila. A babá começa a plantar a ideia de um irmãozinho na cabeça da menina para que ela influencie a mãe. Myriam não poderia ser mais contrária à ideia, e essa resistência mata, dia a dia, as esperanças de Louise.

A falta de perspectiva acaba com o resto de sanidade que havia no comportamento da babá. Ela já não consegue controlar suas ações. Além do sombrio episódio da ossada do frango, Louise observa todos os gestos dos patrões, em busca desse bebê que não vem.

Com o início da primavera e o reencontro com as outras babás do bairro nos parquinhos, Louise tem outra de suas ações impulsivas e maníacas. Voltando para casa ao lado de Lydie, que leva um bebê no carrinho, Louise fica sabendo que uma jovem do bairro está grávida de gêmeos e pode precisar de uma babá.

Mesmo consciente de que seus dias na casa de Paul e Myriam estão contados, Louise tem uma reação de choque: vira o carrinho com o nenê e sai andando a passos largos com Mila e Adan em seu encalço.

Na construção da personagem, esse é mais um símbolo de seu comportamento monotemático. Absorvida por uma profunda depressão, Louise vive uma vida que não é a sua, mas a de seus patrões. O muro que existe entre eles, que fica mais visível para a babá quando a relação entre eles estremece, a deixa atormentada, sem perspectivas.

Em vez de recorrer às babás do bairro, que formam na pracinha uma espécie de sindicato, no qual circulam de ofertas de emprego a notícias sobre ações trabalhistas, Louise guarda distância, preservando seus segredos. Cada vez mais, o que vemos é uma personagem solitária, imersa na vida das famílias das quais é babá, sem que seus próprios problemas jamais sejam foco de atenção. Como no episódio de sua doença, pouco importa o que acontece a partir do momento em que ela deixa a casa dos patrões, desde que esteja lá novamente na manhã seguinte.

Com esse relato sombrio, Slimani se aproxima do fim do livro sem necessariamente apontar culpados. A babá apresenta sinais de tormento psicológico, mas sua invisibilidade social impede que alguém venha em seu socorro. Myriam, afogada em seu trabalho, também não consegue agir em relação à clara deterioração de sua relação com a babá e de episódio. E Paul também prefere se omitir em relação ao desconforto crescente perante Louise em vez de tomar uma atitude que pode colocar em risco sua carreira. Enquanto isso, quem fica verdadeiramente em segundo plano são as crianças. 

Está acompanhando a leitura conosco? Conte para a gente o que você espera do trecho final desta leitura!

Achados & Lidos

Achados & Lidos

Um blog para quem não perde um boa leitura!
Achados & Lidos

Últimos posts por Achados & Lidos (exibir todos)