Leitor no divã (página 2 de 13)

Nós, leitores, somos seres cheios de manias. Queremos sentir que não estamos sozinhas no mundo com nossas, digamos, peculiaridades. Leia, identifique-se e comente!

[Divã] América exótica?

Neste fim de semana, deparei-me com dois conteúdos sobre dois gênios da literatura latino-americana. O primeiro é o artigo The Alienist, sobre Machado de Assis, publicado na revista The New Yorker e escrito pelo autor e crítico literário Benjamin Moser. O segundo é o documentário Gabo: a criação de Gabriel García Márquez (disponível no Netflix), que traz amigos, conhecidos e admiradores do escritor falando sobre sua vida pessoal e profissional. Tanto o artigo quanto o filme despertaram em mim uma reflexão: o que os leitores estrangeiros buscam na literatura da América Latina?

Em seu discurso do Prêmio Nobel de Literatura, Gabo disse:

É compreensível que insistam em nos medir com a mesma vara com que se medem, sem recordar que os estragos da vida não são iguais para todos, e que a busca da identidade própria é tão árdua e sangrenta para nós como foi para eles. (…)

A América Latina não quer nem tem por que ser um peão sem rumo ou decisão, nem tem nada de quimérico que seus desígnios de independência e originalidade se convertam em uma aspiração ocidental.

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[Divã] Quem tem medo de falar de racismo?

Enquanto o mundo assistia embasbacado à atuação do jovem Kylian Mbappé na vitória da França sobre a Argentina, em um jogo que classificou os franceses para as quartas-de-final da Copa do Mundo da Rússia, o youtuber brasileiro Júlio Cocielo proferia uma “piada” absurdamente racista em seu Twitter: para ele, Mbappé “conseguiria fazer uns arrastão top na praia”.

O post gerou furor na internet, mas houve quem defendesse Cocielo: para uma parte de seus fãs, foi apenas uma brincadeira, já que Cocielo tem “bom coração”. Desde então, ele apagou impressionantes 50 mil tweets, não antes que milhares de prints com afirmações homofóbicas e racistas viessem à tona.

Mbappé é um atleta jovem, forte e extremamente talentoso. Comparar a rapidez de suas arrancadas ao potencial de “arrastão” é de um racismo perverso, mas defender o youtuber e afirmar que essa foi apenas uma brincadeira é bastante sintomático do racismo que se esconde nos meandros da sociedade brasileira. É pouco provável que Cocielo dissesse que Cristiano Ronaldo faria arrastões top na praia.

Em seu novo livro, Quem Tem Medo do Feminismo Negro (Companhia das Letras, 145 páginas, R$ 29,90)  Djamila Ribeiro é clara sobre o papel do humor na perpetuação do racismo.

É preciso perceber que o humor não é isento, carregando consigo o discurso do racismo, do machismo, da homofobia, da lesbofobia, da transfobia. Diante de tantos humoristas reprodutores de opressão, legitimadores da ordem, fico com a definição do brilhante Henfil: “O humor que vale para mim é aquele que dá um soco no fígado de quem oprime”.

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[Divã] Navegar é preciso

Viajar é outra paixão do Achados & Lidos. Para além das viagens que nossas leituras nos proporcionam, sempre que possível partimos para conhecer lugares, pessoas e culturas diferentes.

Quem nos acompanha no instagram, está acostumado aos posts com a hashtag #turismoliterário. Nossos roteiros incluem, invariavelmente, passeios relacionados ao universo dos livros.

Minha última aventura foi em Havana, capital de Cuba. Foram muitas as livrarias charmosas que encontrei por lá, mas também me surpreendi com as referências às estadias de escritores famosos na ilha.

Em Habana Vieja, centro histórico e mais turístico da cidade, encontramos o Café La Columnata Egipciana, frequentado por ninguém menos que Eça de Queirós em seu período como Cônsul de Portugal de Havana (1872-1874).

Nesse mesmo bairro, vários pontos lembram outro habitué da cidade: Ernest Hemignway. Vencedor do Prêmio Nobel de Literatura em 1954, o escritor americano era apaixonado pela ilha, onde morou entre 1939 e 1960. Os bares La Bodeguita del Medio e El Floridita, ambos em Havana, trazem na fachada e no seu interior a figura do célebre cliente.

Esses passeios me levaram a pensar sobre o quanto grandes escritores foram (ou são) grandes viajantes. Gabriel García Márquez, por exemplo, embora tivesse uma ligação especial com Cartagena, cidade litorânea de sua terra natal, era um verdadeiro cidadão do mundo. Um dos meus livros favoritos de Gabo é uma coletânea de contos que ele escreveu durante sua temporada na Europa – Doze Contos Peregrinos. São 12 histórias curtas que têm um traço em comum: concentram-se em latino-americanos que perambulam pelo Velho Continente.

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[Divã] Philip Roth e as premiações injustas

No último dia 22, o mundo perdeu um de seus maiores escritores em língua inglesa: aos 85 anos, morreu Philip Roth. Com mais de 30 romances publicados e grande reconhecimento da crítica, tendo inclusive levado um Pulitzer por A Pastoral Americana, Roth passou a fazer parte de uma célebre, ainda que infame, lista: a de autores consagrados que não receberam a maior láurea da literatura mundial, o prêmio Nobel.

Nos últimos anos, Roth foi figura frequente entre os mais cotados a levar o prêmio, mas acabou sendo passado à frente por Svetlana Aleksiévitch (até então desconhecida do público em geral), por um cantor (Bob Dylan) e por um autor mais jovem e menos consagrado (Kazuo Ishiguro). Ainda que sejam escritores de talento inegável, é difícil entender como Roth foi preterido.

É claro que ele não é o único injustiçado – já até fizemos uma lista por aqui sobre grandes autores que não figuram no rol dos homenageados, no qual estão nada menos do que Tolstói e Joyce. Mas a reticência da Academia Sueca, nos últimos anos, em homenagear autores já amplamente reconhecidos é intrigante, quando não amplamente polêmica, como foi com Bob Dylan. Em 2018, vale lembrar, não teremos combustível para animar essa discussão: por causa de escândalos envolvendo acusações de abuso sexual por parte do marido de uma autora membro da academia, o prêmio não será entregue neste ano – havia algo de pobre no reino da Noruega, como brincou o tradutor Jorio Dauster.

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[Divã] Esta é uma obra de ficção

Há alguns dias, ganhei um Kindle da minha irmã. Uma das primeiras etapas da configuração do aparelho é uma pergunta sobre preferências, para que eu receba recomendações alinhadas aos meus gostos. Eu, sempre tão indecisa nas definições de preferidos, sobretudo quando o assunto é livro, não hesitei nem um segundo em marcar o gênero “Literatura ficção”.

Leio biografias, livros-reportagem, ensaios, mas nenhuma categoria me atrai tanto quanto a ficção. Não sei bem as razões dessa inclinação. Às vezes, penso que é vontade de fugir do mundo. Outras vezes, acho justamente o contrário: busco na ficção a compreensão da realidade. Mas será que esses dois universos são assim tão separados?

O blog tornou-me uma leitora mais curiosa. As páginas de um romance já não me bastam para entender a obra. Mergulho em prefácios, epílogos, orelhas, pesquisas na internet ou em outros livros – tudo para conhecer mais detalhes da vida do escritor e, quem sabe, encontrar pistas que me ajudem a compreender melhor o que acabei de ler.

A literatura, enquanto forma de expressão, carrega a história de cada indivíduo. Por mais distante ou surreal que pareça um enredo, há sempre algum aspecto que veio da experiência de vida do escritor. Pode ser um lugar, um personagem ou uma cena: a ficção está constantemente flertando com a realidade.

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