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[Resenha] Para Você Não Se Perder No Bairro

Para Você Não se Perder no Bairro, do francês Patrick Modiano, é um livro curto, de menos de 140 páginas, mas isso está longe de significar uma leitura fácil. O oposto é mais verdadeiro. Essa é uma obra intrincada, repleta de idas e vindas, como se Modiano estivesse montando um quebra-cabeças a partir de fragmentos de memórias, em que cada peça puxa a próxima, até que a tela se complete. Mas, até o desfecho, muitos elos parecerão desencaixados.

A história começa com uma ligação um tanto sinistra. Um homem encontrou uma caderneta de telefones e pretende devolvê-la a seu dono, o escritor Jean Dagarane. Já sexagenário e com pouco contato com o mundo exterior, Dagarane se arrepende do descuido que foi ter colocado seu endereço e nome no pequeno caderno de telefones.

Com medo de ser seguido pelo autor do telefonema, ou encontrá-lo à espreita em sua porta, aceita comparecer ao encontro. Até então, ele vivia num limbo sem lembranças:

Se o sujeito desconhecido não tivesse telefonado, acabaria por esquecer para sempre a perda daquela caderneta. Tentou se lembrar dos nomes registrados nela. Na semana anterior, buscara resgatá-los da memória e começou a fazer uma lista numa folha em branco. A certa altura, rasgou a folha.

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[Resenha] Elizabeth Costello

Ao discursar para uma plateia de acadêmicos sobre o realismo, no primeiro capítulo de Elizabeth Costello, a escritora, que dá nome ao aclamado livro de J. M. Coetzee, questiona as excessivas interpretações a que submetemos as obras literárias:

Houve um tempo que sabíamos. Costumávamos acreditar que quando o texto dizia ‘Havia um copo d’água sobre a mesa’, havia de fato uma mesa com um copo d’água sobre ela, e bastava olhar para o espelho-palavra do texto para vê-los. Mas isso tudo terminou. O espelho-palavra se quebrou, irreparavelmente, ao que parece.

A reflexão, logo nas primeiras páginas desse livro, quando a autora discursa na cerimônia de entrega de um prêmio literário, marca irremediavelmente o fluxo da leitura. Dali para frente, é praticamente impossível continuar a acompanhar a narrativa sem pensar nos significados – visíveis ou sutis – das palestras e diálogos de Elizabeth Costello.

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“Ele anda brincando com a ideia de pedir para encontrá-la em seu tempo livre. Gostaria que passassem uma noite juntos, talvez até a noite toda. Mas não a manhã seguinte. Ele se conhece bem demais para sujeitá-la à manhã seguinte, quando estará frio, ranzinza, impaciente para ficar sozinho. É assim seu temperamento. Seu temperamento não vai mudar, está velho demais para isso. Está fixo, estabelecido. O crânio, depois o temperamento: as duas partes mais duras do corpo.”

 

J. M. Coetzee em Desonra

[Resenha] As Avós

Inspirada pelo último texto da Mari para o Divã, decidi que devia apostar em um nome ainda não citado pelo Achados & Lidos para a resenha desta semana. Olhando para as compras na Festa do Livro da USP (assunto para outro post), escolhi As Avós, de Doris Lessing.

O estilo de Lessing, uma das seis mulheres a levar o Prêmio Nobel de Literatura nas últimas duas décadas, me surpreendeu. Conhecida por seu ativismo político e por seu linguajar afiado ao comentar acontecimentos mundanos, esperava um livro de linguagem forte e rascante, mas o que encontrei foi um tom comedido e, ao mesmo tempo, límpido, como neste trecho de apresentação dos personagens:

Dois belos homens vinham na frente, não jovens, mas apenas o despeito poderia dizer que eram de meia-idade. Um deles mancava. Em seguida duas mulheres tão bonitas quanto eles, de uns sessenta anos – mas ninguém nem sonharia em chamá-las de velhas. Numa mesa evidentemente conhecida deixaram sacolas, cangas e brinquedos, gente serena e radiante, como são os que sabem usar o sol.

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[Resenha] Mudança

Incitado por um editor indiano a escrever “sobre as grandes transformações ocorridas na China ao longo das últimas três décadas”, o autor chinês Mo Yan descartou o tema, em um primeiro momento, por ser abrangente demais. A insistência do editor, que chegou em um momento a lhe dizer que ele poderia então escrever o que quisesse, fez com que Mo não conseguisse mais abandonar a ideia.

De fato, a transição da China de um país essencialmente rural para uma economia de mercado, com as profundas transformações sociais que marcaram o país nas últimas décadas, é assunto que domina prateleiras e mais prateleiras das livrarias.

Mesmo assim, em apenas 125 páginas, Mo Yan deu conta do recado. Mudança é pequeno livro sobre grandes temas, abordados sutilmente. Por meio de episódios aparentemente banais de sua infância e adolescência, Mo fala da vida no campo, da transição das aldeias para as cidades, da influência cotidiana do Partido Comunista na vida social e de um país em ebulição.

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